Poder Individual de Agenda e Negociação em Cortes Constitucionais: evidências do pedidos de vista no Supremo Tribunal Federal

Os ministros do Supremo Tribunal Federal possuem um importante recurso para interferir na agenda do Tribunal, o pedido de vista. Esse mecanismo permite que um ministro retire de pauta um processo já em julgamento, interrompendo a deliberação do colegiado. Em tese, o pedido de vista foi idealizado para permitir que juízes pudessem estudar melhor o processo quando ainda estão em dúvida sobre qual decisão tomar. Entretanto, estudos recentes argumentam que o recurso é solicitado estrategicamente para retirar o caso do plenário quando a decisão do colegiado contraria a posição do ministro (Arguelhes e Hartmann, 2017). De acordo com esse argumento, ministros usariam o pedido de vista como um poder de veto. Valendo-se uma nova abordagem, este artigo procura identificar qual o incentivo predominante para o pedir vista. A partir de ações concentradas de constitucionalidade julgadas entre 1988 e 2016, testamos o impacto da posição dos ministros na ordem de votação sobre a chance de pedir vista. Tendo em vista que as expectativas dos ministros quanto ao resultado do julgamento – bem como a oportunidade para reverter um provável desfecho – variam ao longo da ordem de votação, ministros em posições diferentes teriam incentivos distintos para pedir vista. Com essa abordagem, testamos hipóteses concorrentes: ministros solicitam vista para impedir o desfecho do julgamento que contraria sua preferência; para estudar melhor o processo; ou para tentar construir uma decisão negociada com seus pares. Os resultados mostram que a chance de pedir vista aumenta nas posições intermediárias da ordem de votação, ou seja, entre ministros com expectativas mais claras quanto ao provável resultado do julgamento e que possuem a oportunidade de tentar reverter este resultado negociando com seus colegas que ainda não votaram. Estudar o processo não seria um incentivo dominante, pois o pedido de vista deveria ser uniformemente distribuído ou estar concentrado entre os ministros mais novos. Interromper o julgamento indefinidamente tampouco representa o incentivo dominante, pois a chance de pedir vista deveria ser maior entre as últimas posições, nas quais os magistrados têm clareza quanto ao resultado do julgamento. Nossos achados indicam, portanto, que ministros não desconsideram os demais membros da corte quando utilizam poderes individuais de agenda.

Thiago Nascimento Fonseca /Universidade de São Paulo
Thiago M. Queiroz Moreira /Texas A&M University