Por que a democracia brasileira abriu espaço para o fenômeno Bolsonaro?

O trabalho analisa as bases declinantes da adesão democrática no Brasil. Os últimos anos mostram uma tendência significativa de queda nos indicadores de adesão, de avaliação e confiança institucional, e o afastamento dos cidadãos brasileiros das instituições representativas. Apesar do êxito dos governos socialdemocratas entre 1995 e 2016, marcados pelo fortalecimento das instituições democráticas e por políticas sociais de diminuição da pobreza e desigualdade desenvolvidas pelos governos do PSDB(1995-2002) e do PT (2003-2016), a ruptura política dada com o impeachment da presidente Rousseff agravou o terreno de polarização ideológica e consolidou o caminho de recomposição de forças políticas conservadoras. O severo cenário político e econômico dos últimos anos, também marcado por escândalos de corrupção que atingiram grande parte da classe política, pelo aumento dos índices de violência e pela condução de políticas de ajuste, abriu o país para as possibilidades da política de contestação e do populismo, em um contexto fortemente polarizado. A emergência do fenômeno Bolsonaro, apoiado fundamentalmente em um discurso embasado no nacionalismo, na recuperação do anticomunismo e na defesa de valores comportamentais morais conservadores, e a ascensão eleitoral da extrema direita em 2018, com forte perfil militar, baseada em partidos frágeis, traduzem, em grande medida, a desorganização da política representativa que resulta desse movimento de transformação. A eleição do presidente Bolsonaro em 2018 aponta para o ressurgimento de uma hibridez política perigosa, na direção do que Diamond (2015) alerta para a recessão democrática. Com base na coleção de dados produzidos pelo Estudo Eleitoral Brasileiro entre 2002 e 2018 (survey nacional pós-eleitoral, associado ao Comparative Study of Electoral Systems Project_CSES), o trabalho analisa as percepções e atitudes de massa que caracterizam as condições de funcionamento da democracia brasileira nos últimos 16 anos. Com enfoque nas atitudes com relação ao sistema representativo, analisamos em que medida a diminuição da adesão normativa ao regime democrático e da cognição sobre o significado de democracia, a ampliação do afastamento dos partidos e da desconfiança dos cidadãos com relação às instituições representativas contribuem para a explicação da eleição do presidente Bolsonaro.

Rachel Meneguello /Universidade de Campinas_UNICAMP
Fabiola Brigante del Porto /CESOP / UNICAMP